Bugaku Hoe: a música do tempo
O Bugaku Hoe é um grupo japonês de músicos, que tem mais de 1.200 anos de história e mantém um critério rigoroso para que as tradições não se percam em meio à modernidade dos anos.
Desde o início, as exigências feitas aos ingressantes quanto à disciplina, são um preparo para manter viva a chama do passado. O produtor do grupo Koji Nohara explicou:
Nos primeiros 3 anos, depois de ingressar na orquestra, os jovens não são autorizados a tocar nenhum instrumento.”
Nohara, em entrevista à revista Made in Japan no ano de 2009, contou detalhes, como por exemplo, que é necessário no mínimo 10 anos para que uma pessoa esteja apta a tocar em público. Outra curiosidade é que cada músico aprende a tocar apenas um instrumento.
Antigamente, apenas os pais que tocavam na orquestra passavam os seus conhecimentos musicais para um de seus filhos. Os ensinamentos eram passados de forma oral e o sucessor aprendia o mesmo instrumento do pai. Como afirmou Nohara:
Não existe uma preocupação em transmitir o Gagaku para muitas pessoas. É por isso que a música não sofre alterações e assim se perpetua”
Ainda que os ouvidos que a escutem desconheçam as regras da teoria musical, não compreendam a filosofia budista, tampouco saibam o que cada mantra quer dizer, eles só precisam de atenção e silêncio para se comoverem com a apresentação do Bugaku Hoe.
No ano de 2009, o grupo veio ao Brasil para uma apresentação especial. O espetáculo Tradições Criativas o Bugaku Hoe apresentou, além do Gagaku, o bailado Bugaku e o Shomyo, canto budista de origem tibetana, algo que até então havia sido apresentado apenas para a Corte Imperial Japonesa.
No espetáculo, a música é o elo que liga o homem ao divino. Primeiramente, os monges da seita Shingon entoam o Shomyo e espalham papéis com desenhos de flores de lótus que representam a purificação do ambiente e uma forma gentil de presentear Buda.
Em seguida, são apresentada duas formas de dança Bugaku, executada por um bailarino mascarado vestido com sofisticadas roupas de seda, em que predominam as cores laranja, amarelo e dourado.
Ele dança ao som da orquestra Gagaku, munida de alguns instrumentos simbólicos, como o instrumento de boca, chamado Sho, que representa o som do paraíso.
Um dos instrumentos é o Hichiriki, que possui uma palheta semelhante a do oboé, e é um instrumento que acreditam ser as vozes que ecoam pela Terra. Outro instrumento importante é o Ryuteki, espécie de flauta que representa o dragão que baila entre o universo celeste (o Sho) e o universo humano (o Hichiriki).
Mesmo sendo formado por muitos monges, o grupo enfrentou críticas que o acusava de banalizar o ritual religioso ao levá-lo para os palcos. Chegou a ser dito que os cantos deviam ser cantados apenas nos templos. Essas críticas foram respondidas pelo o monge da seita Tendai, que entoa o Shomyo no espetáculo. Kanko Sakamoto responde com a própria sabedoria budista:
O Budismo diz que Buda está dentro de cada ser, seja planta ou animal. É por isso que a gente pode cantar em qualquer lugar, não só no templo. (…) Dentro do canto do budismo existe um ensinamento: cante e ensine onde quer que for. É isso que estamos fazendo”
O grupo Bugaku Hoe realiza turnês preservando as tradições e ao mesmo tempo levando ao público essa manifestação artística milenar. Nohara conclui:
Eu acredito que as pessoas do exterior se emocionam com o Bugaku Hoe porque existe uma energia no espetáculo. E quando uma cultura é passada para frente, é uma energia que é passada adiante”
Esta reportagem foi publicada originalmente na revista Made in Japan 137, de fevereiro de 2009