Entrevista com Evandro Kawanami
A escola de gastronomia Le Cordon Bleu do Japão, em parceria com o governo japonês, recebeu 15 estrangeiros para um programa de curso e estágio de culinária japonesa (que divulgamos aqui).
Os selecionados ganharam a viagem para o Japão para participar do programa de 8 meses, de julho de 2016 a fevereiro de 2017 e um dos escolhidos foi o brasileiro Evandro Kawanami. Ele viu na viagem uma oportunidade de aprofundar seus conhecimentos na cozinha japonesa e voltou com uma bagagem cheia de experiências.
Em entrevista à Hashitag, Kawanami contou como foi a viagem, o curso na Le Cordon Bleu do Japão e o período de estágio no restaurante Sakae Zushi.
Leia a entrevista completa
Hashitag: Conte-nos de onde veio seu interesse em se tornar chef de cozinha.
Evandro Kawanami: Quando eu tinha 14 anos e morava no Japão, meus pais trabalhavam até tarde e eu e meu irmão tínhamos que preparar o jantar. Aos 23 anos, ainda no Japão, tive a oportunidade de trabalhar em uma cozinha profissional. Lá, aprendi várias lições, não só de técnicas, mas também de disciplina e como respeitar cada ingrediente. Tudo isso me deu um grande incentivo para trabalhar em uma cozinha profissional.
Em 2015, participei do curso de proficiência em sushi realizado pela AJSA (All Japan Sushi Association) e tive a honra de conhecer o mestre Kazato e o chef Shin Koike. Durante este curso percebi o quão pouco sabia sobre sushi, as técnicas, a história e a teoria.
Foi a partir deste curso que decidi aprender mais sobre sushi. Não sei se posso ser chamado de ‘chef’, sinto que ainda tenho muito a aprender e pouca experiência.
H: Como foi sua decisão de participar do processo seletivo do curso?
E K: Soube do curso por uma postagem feita pela revista Hashitag no Facebook. Me interessei pelo programa de estágio no Japão e então discuti com minha esposa essa possibilidade. Foi uma decisão rápida, mas nem por isso fácil.
H: Como foi o processo de preparação para o curso?
E K: Para participar do programa passamos por um processo seletivo. Foi necessário preparar e enviar diversos formulários, currículo, históricos escolares e profissionais, além de responder questões como Qual o seu interesse em participar no programa? e Qual seu objetivo após finalizar o programa?. Meu maior desafio foi responder o formulário em inglês, já que não domino muito da língua.
H: O que mais te surpreendeu ao chegar ao Japão para o curso?
E K: Eu estava mais animado para participar do curso. O país em si não me reservava tantas surpresas, já que eu havia residido ali por 16 anos.
H: A escola Le Cordon Bleu no Japão ofereceu um curso básico aos participantes. Você sente que as aulas oferecidas te prepararam para trabalhar diretamente com os chefs japoneses e, durante o estágio, com os outros colegas de trabalho?
E K: As aulas foram para termos um pouco de conhecimento de quão diferente é a culinária japonesa da culinária ocidental, desde os tipos de facas e como afiá-las até técnicas e tipos de cortes de legumes. Foram bastante úteis mas não o suficiente para trabalharmos diretamente com os pratos que seriam servidos aos clientes, a maioria do serviço era a preparação (mise en place).
Sinto que tive muita sorte em estagiar no restaurante Sakae Zushi onde o proprietário é o mestre Kazato, que veio ao Brasil em 2015 para ministrar o curso de proficiência do qual participei. Acredito que tive mais contato com os pratos do restaurante do que outros participantes do programa.
H: Além de ter aulas [de japonês e de gastronomia], como era sua rotina?
E K: Durante os dois primeiros meses de curso tínhamos as tardes ou manhãs livres e fins de semanas de folga. No período de estágio cada um seguia a escala do restaurante.
Acostumei a acordar bem cedo, por volta das 4h da manhã, para ir ao mercado de peixes. Lá, eu procurava quase sempre por kohada, akagai e anago [peixes comuns no Japão] e, depois, seguia para o restaurante, onde iniciava a preparação do almoço. Eu costumava observar como cada tipo de peixe era transportado e conservado e, quando tinha algum tempo livre, prestava atenção às técnicas de outros profissionais.
H: Além de você, existiam participantes de outros países. Quais aprendizados você sente que adquiriu com as experiências deles? Como era o contato e a interação entre vocês?
E K: Os outros participantes eram dos Estados Unidos, do Canadá, da Inglaterra, da Áustria, da Rússia, da Letônia, de Singapura, de Taiwan, de Hong Kong e da Turquia. Nossa comunicação era sempre em inglês. Trocamos muitas experiências e receitas, até hoje mantemos contato e temos planos de realizar um evento em conjunto.
H: Como foi processo de seleção para os estágios.
E K: Na inscrição, tínhamos que demonstrar interesse por duas opções para o estágio e, nas duas últimas semanas do curso, participamos de entrevistas com a secretaria do programa junto aos responsáveis da escola para decidirem para qual restaurante cada participante seria direcionado. Essa decisão foi baseada nos requisitos de cada restaurante e no perfil de cada participante.
H: Durante o estágio, quais eram suas principais funções?
E K: Cuidar do preparo dos peixes, montagem de alguns pratos que eram parte do cardápio do almoço, montagem das entradas e também auxílio no serviço de delivery.
H: Com quais ingredientes você trabalhou com mais frequência e quais pratos eram os mais pedidos?
E K: Foram diversos peixes como kohada, carapau, cavalinha, sardinha, baby pargo, anago e akagai. Um dos pratos mais pedidos no almoço era o “donburi de sushi” (tigela com arroz de sushi com fatias de diferentes peixes) ou um combinado de sushis sortidos, preparados com peixes da região.
H: Quais surpresas você encontrou nesse período de estágio e o que mudou para você desde então?
E K: O que surpreendeu muito foi a grande variedade de peixes, verduras e legumes do Japão e a qualidade de cada ingrediente. A vontade de abrir um restaurante ainda não mudou. O que mudou foi a vontade de utilizar mais produtos japoneses, minha preocupação é se irei encontrar esses ingredientes por aqui.