Conteúdo da Hashitag #21

Kitakata, a cidade que amanhece com lámen

Foto: Divulgação

Fachada do Ban-Nai Shokudô, um dos pioneiros na região a difundir o rámen

Assa-rá. É assim que os habitantes de Kitakata, uma pequena cidade de 37 mil habitantes na província de Fukushima chama o ato de comer lámen logo de manhã. Sim, as casas costumam abrir às 7 horas da manhã.

Kitakata, juntamente com Sapporo e Hakata, forma a tríade das capitais do lámen no Japão. Em termos proporcionais, tem a maior quantidade de casas de lámen por habitante. São 120 ramen-ya oficialmente cadastradas, o que dá aproximadamente uma casa da lámen para cada 300 habitantes. Se aplicada a mesma proporção para São Paulo, por exemplo, deveríamos ter 42 mil casas de rámen na cidade.

Por que esta cidadezinha se tornou, digamos, a meca do lámen?

Shoyu Ramen do Restaurante Kiichi. Caldo leve de frango, muitas fatias de copa-lombo, tenros e quase sem tempero, e cebolinhas frescas


Na década de 1930, o cozinheiro e puxador de yatai (carroças de comida) Ban Kinsei começou a vender o China-soba, um ensopado de macarrão que se tornou uma iguaria nos tempos de escassez de alimentos e muita pobreza na região. Surgiram seguidores da receita de Ban que ajudaram a difundir o prato. Alguns montaram seu negócio abrindo botecos, como o Makoto Shokudô e Ban-nai Shokudô, ainda em atividade na cidade de Kitakata. Logo, o macarrão se alastrou pela cidade, conquistando especialmente os trabalhadores braçais das fábricas da região, que na volta do serviço noturno, às primeiras horas da manhã, aproveitavam para forrar o estômago antes de retornarem às suas casas para descansar. Também os agricultores, após a primeira colheita do dia, acorriam às casas de lámen para uma refeição matinal.

Hoje não há mais operários do turno da noite e comer lámen de manhã virou um folclore, praticado principalmente por turistas que vêm de todas as partes do Japão à procura de uma imersão cultural.

Foto: Reprodução

Panfleto com o Guia do Lámen de Kitakata, distribuído na estação de trem e nos hotéis da cidade.

A cidade é também conhecida por seus “kura”, armazéns vernaculares usados como depósito de produtos, o que incorpora mais um ponto de interesse turístico. Além disso, Kitakata é conhecida também pela produção dos melhores saquês artesanais, como o Yauemon, que já é encontrado no mercado brasileiro. Uma das razões pela qual se produz ótimos saquês em Kitakata é a qualidade da água que brota das fontes límpidas das montanhas da região. Essa mesma água é responsável pelo leve caldo dos lámen e também pela consistência do macarrão, que em Kitakata tem o formato achatado e ondulado, que proporciona maior aderência do caldo.

Na década de 1980, a televisão descobriu este “oásis histórico” perdido no interior do Japão, e Kitakata virou foco em programas de turismo e serviu de cenário para várias novelas, o que provocou um boom de turistas.

Para dar conforto a estes novos visitantes, ávidos para ver este cenário bucólico e retrô, a secretaria de turismo de Kitakata investiu na promoção do rámen. Em 1987, a Prefeitura e a Câmara de Comércio e Indústria da cidade convocaram todos os restaurantes de lámen e produtores de insumos do perímetro urbano e criaram uma associação: o Kitakata Ramen Kai. A associação permanece ativa até hoje,e já criou na cidade o Museu do Rámen. Por iniciativa espontânea, surgiu também um Santuário do Lámen para dar um respaldo religioso à vocação gastronômica da cidade e invocar proteção divina. Então, longa vida ao lámen!

Jo Takahashi Jo Takahashi foi consultor de arte e cultura na Japan Foundation, onde atuou por 25 anos como administrador cultural. Agora, migra essa experiência para a sua produtora independente, a Dô Cultural, que propõe um conceito design de formatar e desenvolver o projeto cultural.
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